Passado presente de Marina Soares
Por Eduardo Romero, 2021
Segundo o físico Fritjof Capra (1939 -) em seu livro A teia da vida (1996), a seta do tempo é irreversível, ou melhor, que muitos elementos orgânicos e inorgânicos na natureza e na cultura se dissipam ou se re-organizam, pois os fenômenos são sistemas abertos em constante transformação.
A reorganização dos sistemas na seta irreversível do tempo, sejam eles concretos/arquitetônicos/artísticos ou fatos sócio-históricos, perdem substâncias formais e imanentes que se ressignificam na própria passagem do tempo em que novos elementos se agregam, num movimento não linear de ordem e desordem.
Por extensão ao pensamento sistêmico na biologia e na física, na arte podemos considerar de maneira poética, que a obra de arte interrompe a seta do tempo, cristalizando valores estéticos, éticos e morais das culturas, mas que ainda assim, sofrem as ressignificações dos sistemas abertos, agregando novos valores, novas interpretações e novos olhares.
A série fotográfica revelada em caffenol Passado presente de Marina Soares, traz esses novos olhares e questionamentos sobre as ressignificações formais e imanentes na seta do tempo. Ao fotografar os ornamentos das fachadas dos casarios do Sítio Histórico de Olinda, Marina refaz o movimento de congelar a seta do tempo que, no caso de tais ornamentos, já se encontra se temporalmente imóveis, se reorganizando e se ressignificando enquanto história de nossa cultura. O enquadramento das imagens em Passado presente, busca isolar a beleza desses ornamentos no contexto em que se encontram, trazendo um olhar per si do valor estético dessas formas.
Ao revelar os enquadramentos dos ornamentos das fachadas com o processo histórico e alternativo fotográfico denominado caffenol, Marina intenta reverter poeticamente a seta do tempo, pois a técnica do caffenol produz imagens naturalmente com aspectos de fotografias antigas, ou melhor, imagens que sofreram a ação do próprio tempo.
A articulação entre fotografias realizadas no contexto atual de elementos ornamentais históricos que se mostram através da visualidade da revelação em caffenol como imagens antigas e desgastadas pelo tempo, recrudesce as ideias do pensamento sistêmico que nos informa que, embora o tempo seja irreversível, muitos elementos e fenômenos perduram e outros desaparecem em intensa articulação, assim como novos olhares ressignificam marcos importantes da nossa história.
Passado presente de Marina Soares faz esse movimento de ressignificação do olhar, revelando outra perspectiva dos ornamentos das fachadas do Sítio Histórico de Olinda, num movimento simultâneo de ordem e desordem dos valores estéticos de nossa história, marcos de transformação que podem ser atestados pela sensibilidade da imagem fotográfica.
Eduardo Romero
Artista visual, professor
https://eduardoromero.com.br/